Antes de qualquer coisa é preciso esclarecer que estamos falando aqui de uma tendência (ou posicionamento) filosófico, e não daquilo que popularmente se costuma chamar de "idealismo". Portanto não estamos falando de uma tendência a perseguir grandes ideais ou a lutar por certos princpípios e valores, ou qualquer coisa assim. Nada disso. Estamos falando, isso sim, de uma tendência de pensamento que se concentra sobretudo na grande área geral de atuação intelectual que é a Filosofia. "idealismo", enquanto tendência filosófica, é aquela que está ligada à supervalorização das ideias e daquilo que não é material ou captável pelos sentidos.
Mas não é um posicionamento de efeitos pura e exclusivamente filosóficos: o idealismo filosófico tem fortes implicações e decorrências nas Ciências Humanas em geral, e entre elas principalmente na História e na Sociologia. Mas também tem, em muitos casos, fortes relações com essa grande área geral que aqui, no site ProjetoQuem, estamos chamando de Para Além do Argumento — área que envolve religiões, misticismo, ocultismo, magia e linhagens diversas do pensamento oriental voltadas para o cultivo não argumentativo da espiritualidade humana.
Além disso, o idealismo filosófico tem também algumas fortes implicações e decorrências no campo das práticas e posicionamentos políticos, e e um outro campo bastante diferente: o campo das Artes.
Mas antes que todas essas implicações e relações floresçam, elas são germinadas pela atuação do idealismo dentro do próprio campo da Filosofia. E nesse campo, o idealismo é uma tendência cuja principal atuação direta está em duas sub-áreas da Filosofia: a Epistemologia (Teoria do conhecimento) e a Teoria ontológica (teoria sobre o "ser" das coisas, ou o fundamento da realidade e de tudo o que existe).
Os principais pensadores idealistas podem ser divididos em três grandes grupos segundo o contexto histórico em que apareceram. Primeiro houve Platão, na antiguidade, que teve muitos seguidores igualmente idealistas, mas ficaram eclipsados sob a sombra de sua fama e influência. Seu aluno Aristóteles pode-se dizer conseguiu desenvolveu luz própria como filósofo, e conseguiu escapar a essa sombra. Mas Aristóteles não pode ser considerado um puro idealista, apesar de ter em sua filosofia alguns fortes elementos idealistas.
Depois houve Descartes, na França renascentista, que provocou o aparecimento de outros idealistas (seguidores dele ou não), como Leibnitz ou Berkeley. Por último, temos os idealistas alemães que vieram na sequência de Emannuel Kant, investigando certas trilhas de pensamento abertas por ele — uma sequência de três grandiosos pensadores idealistas, na verdade, que chegaram a se conhecer e trabalhar intimamente juntos, antes de surgirem divergências que os afastaram: Fichte, Schelling e Hegel.
Em que medida o próprio Kant deve ser ou não colocado na lista como o primeiro dos "idealistas alemães" é um problema de interpretação dos estudiosos de sua filosofia, e não se pode considerar esse problema completamente resolvido. Embora haja de fato os que classificam Kant como um "idealista alemão" (ou um "idealista transcendental", utilizando uma terminologia que aparece nas próprias obras de Kant) ele pode contudo ser igualmente classificado como "filósofo crítico", e o criticismo não é exatamente um idealismo.
Enquanto o idealismo está fundado na valorização do plano das ideias, do espiritual, ou do imaterial, o criticismo está fundado no exame dos limites e possibilidades de diferentes capacidades humanas (o que seria o caso de Kant) ou de diferentes concepções. Um criticista (ou filósofo crítico) pode por exemplo se concentrar no exame dos limites e possibilidades da capacidade humana de formular ideias racionais, e também ao mesmo tempo (por que não?) nos limites e possibilidades da capacidade humana de captar as coisas do mundo material ao seu redor por meio de suas sensações físicas.
O idealismo de Platão se funda na concepção de um plano metafísico e superior ao mundo material, no qual segundo ele estão localizadas as "essências" reais, perfeitas e estáveis de todas as coisas. É o que se chama de um idealismo objetivo, porque para ele aquilo que está no plano ideal (as tais "essências") é algo que existe objetivamente fora de nós, independentemente de nossa própria existência. As famosas "ideias" platônicas — que aqui estamos, por uma simplificação, chamando sem maior discussão de "essências" — não estão na nossa mente ou no nosso pensamento, como aquilo que normalmente costumamos chamar de "ideias". As "idéias" ou "essências" platônicas continuariam existindo mesmo que todos os seres humanos deixassem de existir na face da terra.
O idealismo cartesiano, bastante diferente, é o que se chama de um idealismo subjetivo. Está fundado na noção de que não temos acesso à realidade objetiva fora de nós a não ser através das nossas ideias a respeito dela, de modo que as ideias são tudo o que podemos acessar da realidade. Mas essas idéias estão na mente do sujeito que as pensa. Podemos seguir métodos para firmar nossas certezas a respeito delas, e para nos assegurarmos tanto quanto possível da sua verdade. Mas elas só existem no campo subjetivo, na subjetividade, na mente, de que as está pensasndo e concebendo.
Fichte, Schelling e Hegel, nesta sequência, vão caminhando cada vez mais para um idealimo objetivo (mais similar ao de Platão que ao de Descartes), no qual as realidades do plano ideal: não estão separadas do mundo material; são dinâmicas; e são inter-relacionadas segundo uma certa lógica que lhes é própria — e que veio a receber em Hegel o nome de "dialética". Em outras palavras, nesta sequência de pensadores o plano ideal vai se tornando cada vez mais entrelaçado com o plano material e adquirindo cada vez mais claramente a feição de uma espécie de estrutura lógica e dinâmica (a "dialética") por debaixo da realidade, e que a exprime no que ela tem de mais profundo e essencial.
Embora o termo "dialética" seja oficialmente referido a Hegel, se compreendermos a dialética como algo que foi se desenvolvendo historicamente — o que se ajusta melhor ao próprio sentido da dialética — e não como algo criado por alguém em um determinado momento, poderemos considerar todos os três (Fichte, Schelling e Hegel) não só como idealistas, mas também como participantes da tendência dialética. É a posição assumida neste site.