Ditos & Feitos de Artaud

Seleção e organização das citações por João R. A. Borba


Sumário


 

Ditos & feitos de Artaud, o "maldito"
Sobre cultura, filosofia, teatro, pensadores e explicações

 

Sobre a cultura

Mais urgente não me parece tanto defender uma cultura cuja existência nunca salvou uma pessoa de ter fome e da preocupação de viver melhor, quanto extrair, daquilo que se chama cultura, ideias cuja força viva é idêntica à da fome.


ARTAUD. O teatro e seu duplo.
São Paulo: Max Limonad, 1984, p.15

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   Sobre filosofia

Não diria que os sistemas filosóficos sejam coisas para se aplicar direta e imediatamente; mas, de duas, uma:
         Ou esses sistemas estão em nós e nos impregnamos deles a ponto de viver deles, e então que importam os livros? Ou então não estamos impregnados por eles e nesse caso não merecem nos fazer viver; e, de todo modo, que importa se desaparecerem?

 

ARTAUD. O teatro e seu duplo.
São Paulo: Max Limonad, 1984
, p. 16

 

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   Sobre o teatro

A peste se apodera das imagens adormecidas, da desordem latente e as impulsiona de repente até o ponto dos gestos mais extremos; do mesmo modo, o teatro se apossa dos gestos e os exaspera: assim como a peste, o teatro refaz os elos entre o que é e o que não é, entre a virtualidade do possível e a natureza materializada.

 

ARTAUD. O teatro e seu duplo.
São Paulo: Max Limonad, 1984
, p. 39

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Sobre os estudiosos e intelectuais

Todos aqueles que possuem pontos de referência no espírito, quero dizer, de um lado certo da cabeça, sobre lugares bem demarcados no cérebro; todos aqueles que são mestres da língua; todos aqueles para quem as palavras têm sentido; todos aqueles para quem existem elevações da alma e correntes do pensamento, aqueles que são o espírito de sua época e que nomeiam essas correntes do pensamento; penso nas suas mesquinhas atividades precisas e nesse ranger de autômatos vomitando para todos os lados por seu espírito; — são porcos.

 

ARTAUD. O pesa-nervos. In Escritos de Antonin Artaud.
Porto Alegre: L&PM, 1986, p.21-22

 

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     Sobre explicar ou mostrar

Em meio a uma séria conferência na Universidade de Sourbonne sobre O teatro e a peste (um dos ensaios do livro O teatro e seu duplo), pouco a pouco e sem que o público percebece direito o que estava acontecendo, Artaud foi transformando sua própria fala em uma encenação teatral, na qual ele mesmo parecia ir contraindo a peste conforme falava sobre ela, até não conseguir mais falar e cair estrebuchando como um moribundo.

A representação não era cômica: era intensa e autêntica, quase uma cena de terror. Mas depois do choque inicial, o público começou a rir e assobiar. Mais tarde, longe do público, Artaud mostrou-se indignado e irritado com essa reação: sua mensagem contra as explicações racionais, que não são capazes de realmente mostrar o que dizem, era uma crítica agressiva e radical. Os estudantes da Sourbonne não foram capazes de captá-la e, quebrada a expectativa de um discurso sério e acadêmico, partiram para a zombaria.
        A cena é belamente descrita e comentada no diário íntimo de sua amiga, a escritora de contos eróticos Anaïs Nin, que havia conhecido Artaud através de um destacado psicanalista da época, René Allendy, que também estava presente nessa "performance" inesperada de Artaud na Sourbonne. Essa passagem do diário de Anaïs Nin pode ser encontrada nos Escritos de Antonin Artaud, ed. L&PM, 1986, p. 164-166.

 

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