Tópicos de vida e obra de Stutchka

Pesquisa & Texto da autoria de João Ribeiro de A. Borba

Jan/2021

 

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Stutchka: entre os filósofos marxistas do direito,
o primeiro a realmente fazer diferença

 

Qual foi a contribuição de Stutchka para a filosofia jurídica marxista?

Piotr Stutchka foi um importante filósofo do direito marxista.

Antes de Stutchka, os pensadores marxistas do direito apenas examinavam se os agentes jurídicos (juízes, legisladores etc.) praticavam o direito a partir de uma mentalidade capitalista ou a partir de uma mentalidade anticapitalista –– concentrando a atenção principalmente no direito trabalhista e nas discriminações de classe social e econômica ocorridas no direito penal e criminal.

Stutchka foi o primeiro a conectar mais consistentemente o pensamento jurídico com o pensamento original de Marx, considerando o direito –– inclusive em os próprios conceitos jurídicos –– como um produto histórico das relações de produção do capitalismo, marcado pela luta de classes.

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Qual a importância de Stutchka no estudo
das relações entre direito e sdociedade?

Mostrou uma concepção do direito que se afastava das abstrações filosóficas de muitos jusnaturalistas e dos pontos de vista mais puramente técnicos como o de Hans Kelsen, revelando relações íntimas do direito e de seu funcionamento com as relações sociais, como o próprio Marx havia feito, mas detalhando melhor essas relações entre direito e sociedade.

Na verdade é total, completa e absolutamente falso atribuir a Marx o primeiro exame dessas relações, como muitos marxistas pretendem –– isto foi feito antes dele, por exemplo, já na antiguidade até certo ponto pelo sofista Protágoras, mais completamente depois por Aristóteles numa outra direção, mais tarde por Savigny (ainda que de maneira um pouco simplória), e no mesmo século XIX de Marx mas antes deste por Proudhon –– que o fez com níveis de detalhamento e aprofundamento maiores que os do próprio Marx e de Stutchka (Proudhon, pode-se dizer, tem toda uma filosofia do direito e principalmente toda uma complexa sociologia do direito conectada a ela, que foi mais adiante explorada e desenvolvida em alguns de seus aspectos mais interessantes pelo famoso pluralista jurídico Georges Gurvith).

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De que modo o marxismo aparece na teoria do direito de Stutchka?

Stutchka pensou o direito apoiando-se principalmente no conceito marxiano de “luta de classes” (também presente em Proudhon antes de Marx, mas que apresenta em Proudhon maior complexidade e elaboração conceitual muito mais cuidadosa do ponto de vista sociológico).

Para Stutchka as principais instituições jurídicas no capitalismo, aquelas mais marcadas pela presença da luta de classes e que fazem do direito um mero instrumento a serviço das classes dominantes, são o direito de propriedade, o contrato de compra e venda e o contrato de trabalho.

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Como o campo do direito se organiza segundo Stutchka?

Segundo Stutchka, a forma jurídica concreta, a forma concreta do direito, está em no fato de ser uma expressão das relações capitalistas de produção. Mas além dessa forma jurídica concreta, o direito tem pequenas nuances e variações em sua periferia, que não são estruturais e exprimem principalmente variações ideológicas no pensamento capitalista, ou possivelmente linhas de pensamento em alguma medida divergentes.

Aí se encontram por um lado a forma abstrata do direito, que aparece em normas mais puramente técnicas e sem conexão direta com a realidade da vida social, e por outro lado a forma intuitiva do direito, que é aquele nível psicológico do qual falavam os pensadores jurídicos marxistas anteriores: sentimentos, consciência etc. (ou resumidamente “ideologia”) dos juízes, legisladores e agentes jurídicos em geral –– porque Stutchka reconhece que há um (pequeno) espaço para a manifestação dessas variações de posição ideológica, dentro da estrutura capitalista mais geral do direito.

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Stutchka acredita na possibilidade de um direito revolucionário?

Stutchka afirma a possibilidade da criação de um direito proletário revolucionário, mas apenas como algo provisório, na transição para uma sociedade não-capitalista do futuro. Para instaurar este direito revolucionário de transição seria preciso quebrar totalmente a estrutura burguesa capitalista do direito tradicional. Seria importante ainda tomar o cuidado de não valorizar demais o direito como instrumento revolucionário, porque ele não teria força para direcionar por si só a revolução e ainda poderia trazer o risco de um retrocesso com a sobrevivência parcial de estruturas capitalistas, se a destruição de sua estrutura tradicional não chegasse a ser completa.

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A crítica do direito feita por Stutchka foi cuidadosa e aprofundada?

Stutchka faz essa crítica do direito capitalista sem focalizar com suficiente cuidado e detalhamento as características específicas e o funcionamento interno do direito, dando mais atenção às relações do direito com a luta de classes. E sua ideia de um direito revolucionário provisório, de transição, serviu para a ditadura de Stalin se justificar, levando adiante o que chamava de “direito revolucionário” como algo supostamente provisório, por um período de tempo que na verdade parecia interminável, sem qualquer previsão de térimino do suposto “período de transição” revolucionário.

Quem vai levar isto muito mais longe examinando o direito por dentro em todos os seus detalhes e especificidades e em sua lógica própria de funcionamento, mas ao mesmo tempo aprofundando e radicalizando ainda mais essa crítica, é o marxista Patchukanis. Mas este recusava qualquer possibilidade de uma estrutura jurídica que fosse verdadeiramente anti-capitalista, o que significava acusar a estrutura jurídica do regime stalinista de ser no fundo capitalista… de modo que Patchukanis foi, como se poderia prever, perseguido e morto pelo regime ditatorial de Stalin.

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