Tópicos de vida e obra de Thoreau

Pesquisa & Texto da autoria de João Ribeiro de A. Borba

Jan/2021

 


 

Thoreau: naturalista e filósofo anarquista,
nas origens do ecologismo

 

Quem foi Thoureau?

Pensador anarquista moderado, o norte-americano Henry David Thoreau escreveu mais de 20 volumes de obras como naturalista, historiador e filósofo, mas é conhecido apenas por duas: o livro Walden, ou A vida nos bosques e o ensaio A desobediência civil. O primeiro desses textos o coloca como um dos precursores do ecologismo, seguido pouco mais tarde pelo anarquista Kropotkin. O outro marca mais acentuadamente seu posicionamento anarquista, propondo uma interessante e inteligente via para os protestos contra a ordem jurídica e política estabelecida.

Suas obras –– especialmente essas duas e das duas principalmente a segunda –– tiveram grande influência sobre o pensamento anarquista estadunidense, mas também sobre o pensamento ultraliberal de resistência contra os excessos e abusos de poder do Estado.

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Qual o conteúdo do livro Walden, ou A vida nos bosques?

Thoreau a certa altura da vida foi viver por um tempo isolado da sociedade, numa floresta às margens do lago Walden, para observar e analisar a vida natural, e o resultado da experiência foi esse livro.

No livro, além de demonstrar com essa experiência de vida a perfeita possibilidade de se viver distante da sociedade, ressaltando as potencialidades do indivíduo –– o que chamou a atenção dos ultraliberais, que valorizavam o individualismo.

Por outro lado, observando o comportamento dos animais na floresta e no lago, Thoreau tirou conclusões contrárias ao "darwinismo social", que era seguido pelos mesmos ultraliberais capitalistas, e com isso se posicionou junto aos anarquistas.

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O que era o "darwinismo social" e como Thoreau demonstrou
que esse darwinismo era falho?

Charles Darwin foi o mais famoso de todos os naturalistas, e o principal pensador da Teoria da Evolução. Um dos princípios mais básicos da teoria darwinista da evolução era a luta das espécies umas com as outras e pela sua sobrevivência, e dos indivíduos dentro de cada espécie uns com os outros pela sobrevivência dos seus genes, isto é, para passar adiante a sua genética através da reprodução.

O "darwinismo social" foi uma versão superficial e bastante distorcida disso, visando justificar o ambiente de competiç!ao constante pelo enriquecimento, na vida capitalista. A ideia básica era a de que competir lutando pela sobrevivência era algo natural e também era perfeitamente natural (e merecido) que sobrevivessem e enriquecessem os "mais fortes" e os outros empobrecessem (caminhando em última análise em direção ao desaparecimento ou à morte).

Thoreau mostrou que essa noção do que é "natural" estava errada, e fez isso de um modo capaz de afetar até mesmo diretamente a própria teoria evolucionista de Darwin, apresentando uma crítica que a mostrava não exatamente como uma teoria "errada", mas como uma teoria parcial e incompleta. Por quê? Porque a observação cuidadosa e científica dos fatos mostrava que os animais não estão apenas em luta uns contra os outros pela sobrevivência: ao mesmo tempo que há luta, existe também uma intensa e importante cooperação entre os animais, e sua sobrevivência depende de todo um sistema de interações (hoje diríamos um "sistema ecológico") em que essa cooperação desempenha um papel fundamental.

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É neste ponto que Thoreau foi desenvolvido e aprofundado mais tarde pelo anarquista mais radical Kropotkin. Um crocodilo, por exemplo, mantém em certo momento a boca aberta para que certos pássaros pousem em sua língua e usem os bicos para comer microorganismos que estão em sua boca. Os microorganismos seriam prejudiciais para o crocodilo, de modo que os pássaros estão cooperando com ele. E o crocodilo permite que os pássaros façam isso sem comê-los, de modo que está cooperando com eles, que se alimentam desses microorganismos.

Mas há uma diferença entre o ser humano e os outros animais: os outros animais agem movidos por instinto, enquanto os seres humanos têm liberdade muito maior para decidir como agir.

Se a cooperação é tão natural e tão importante na natureza quanto a competição, não faz sentido dizer que é natural a competição na sociedade e que alguns saiam vitoriosos economicamente e sobrevivam enquanto outros empobrecem e morrem, como se dizia no "darwinismo social". E se o ser humano tem liberdade de escolha e não está preso aos instintos, pode escolher seguir os instintos competiticvos ou os instintos de cooperação e solidariedade, e nada mais justifica escolher uma situação de competição em que muitos vão ser prejudicados quando se pode escolher uma situação em que todos se beneficiam.

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Qual o conteúdo do ensaio A desobediência civil ?

Neste ensaio thoreau assume uma posição anarquista moderada, mostrando como é possível protestar contra a ordem jurídica e política oficial sem que ninguém possa acusar quem está protestando de ir contra a lei e o direito oficial.

Como isso é possível?

Acontece que o direito jamais é completo e perfeito. Sempre existem muitas lacunas na lei, coisas que não foram previstas por lei. E também existem interpretações das leis oficiais que são possíveis, mas que não foram imaginadas pelos legisladores nem seriam aceitas por eles.

Se um protesto for feito de uma maneira tal que não haja nenhuma lei dizendo que fazer aquilo é proibido, ou se a lei possa ser interpretada de uma maneira que torna aquilo juridicamente aceitável, não há como proibir o protesto. Essa ideia permite que sejam realizado gestos simbólicos de protesto criativos, originais e imprevistos, que embaraçam o sistema jurídico porque a polícia e os órgãos oficiais não podem reagir contra esses gestos como se fossem ilegais.

Um exemplo no Brasil foi o de um sujeito que apareceu em vídeos nas redes sociais em pé em cima de um orelhão (cabine telefônica pública redonda de aproximadamente 1 metro que pende do alto de um poste de uns 2 metros) com um cartaz de protesto nas mãos. Parado em cima do orelhão, ele chamava atenção para seu protesto, porque normalmente, ninguém minimamente sensato subiria num orelhão para ficar de pé lá em cima. Um policial tentava fazê-lo descer, mas ele respondia: "Me mostra a lei que me proíbe de ficar de pé em cima de um orelhão!".

O policial não podia fazer nada sem ser acusado de abuso de autoridade, porque de fato, não havia nenhuma lei proibindo as pessoas de ficarem de pé em cima de um orelhão. Afinal, quando foram criados os orelhões e as leis que regulamentavam o seu uso, nenhum legislador poderia imaginar que alguém algum dia faria isso.

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